ANÁLISE
DE CONFORMIDADE
A
E-SOCIAL impõe uma nova forma de registro trabalhista, onde os prazos para
escrituração refletem o previsto na legislação competente. Um dos temas que
envolvem o modelo operacional da E-SOCIAL está nas possíveis trilhas de
auditoria que podem ser identificadas na execução do modelo até então divulgado
pelo comitê gestor do projeto.
Fala-se muito em
conformidade, em termos teóricos, e não vejo melhor forma de apresenta-la que
não seja por meio de análises comparativas envolvendo situações reais, para que as partes interessadas
(empregadores, contabilistas, empresas de TI e o fisco) possam ter ciência
melhor dos problemas e desafios impostos pelo projeto.
Neste aspecto,
imaginando uma hipotética vigência, será possível ao Ministério do Trabalho e
Emprego (MTE), por exemplo, mapear de forma bem detalhada, não somente os dados
analíticos sobre os eventos, qualificados pelo sequenciamento lógico, mas
também o momento em que foram devidamente formalizados pelos empregadores, e se
a respectiva ocorrência se deu dentro das normas observando ou não os prazos
legalmente estabelecidos para cada situação.
Cabe lembrar que os
prazos não são da E-SOCIAL, e sim da legislação aplicável. Foi pensando nisso
que realizei um levantamento de quatro eventos trabalhistas em um escritório
contábil com 132 clientes, com uma massa média mensal de 1.598 trabalhadores,
entre os meses de junho e agosto deste ano. Na amostragem, foram selecionados
os seguintes tipos de eventos:
1. ADMISSÃO;
2. ACIDENTE
DE TRABALHO;
3. AVISO
PRÉVIO RESCISÓRIO (A PEDIDO DO EMPREGADO OU DO EMPREGADOR);
4. AVISO DE
DISPENSA (DEMISSÃO SUMÁRIA POR PARTE DO EMPREGADOR).
OBJETIVO
O objetivo do
levantamento foi possibilitar um diagnóstico mais preciso sobre os níveis de
conformidade sobre a escrituração de determinados eventos trabalhistas observando
não as atuais obrigações (RAIS, DIRF, MANAD, CAGED, GFIP), mas os critérios
determinados pela legislação sobre os prazos para efetivação dos registros ora
em análise.
FORMULÁRIO
DE COLETA
Foram autorizados, para
publicação neste artigo, os dados consolidados e formatados a partir da coleta
por meio de formulários (fichas) contendo as seguintes informações:
MEIO DE COMUNICAÇÃO: ( ) EMAIL ( ) WEB ON LINE ( ) MALOTE
EVENTO
TRABALHISTA: ( ) ADMISSÃO ( ) ACIDENTE DE TRABALHO ( ) AVISO PRÉVIO RESCISÓRIO ( ) AVISO DE DISPENSA
( ) FÉRIAS ( ) RETENÇÕES DE TRIBUTOS
DATA
DA ESCRITURAÇÃO:
HORA
DA ESCRITURAÇÃO:
CÓDIGO
DO OPERADOR:
CÓDIGO
DO EMPREGADOR:
CÓDIGO
DO TRABALHADOR:
Após a consolidação dos dados, observou-se que os
eventos de férias e retenções de tributos não foram devidamente registrados
quanto aos propósitos do levantamento: Foram identificadas omissões e alguns
problemas de interpretação, e ao se tentar estabelecer estimativas por modelos
quantitativos, o padrão do intervalo de confiança ficou no máximo em 63,38%,
desqualificando os eventos em questão.
Os demais eventos não precisaram passar por modelos
de estimativas, e foram aceitos. Os formulários preenchidos representam a
totalidade dos eventos ocorridos no período observado.
Como contraprova, um levantamento no sistema de
folha de pagamento confirmou a totalidade dos eventos selecionados para a pesquisa,
proporcionando a ausência de omissões, proporcionando margem de 0% de erro
quanto a esse quesito. O mesmo critério
foi usado para identificar as omissões dos quesitos excluídos da consolidação.
Apesar de ter o universo (100% dos fatos) também
foram reavaliadas, por critério de amostragem, a aplicação da tipologia dos
eventos e as interpretações de conformidade ou não, adotadas pelos
colaboradores do escritório. O intervalo de confiança da pesquisa por
amostragem ficou em 98,26%.
O modelo de revisão foi mais uma contraprova para
dar segurança sobre a identificação dos eventos, por parte dos colaboradores,
assim como se a interpretação sobre a conformidade estava certa ou não.
CRITÉRIOS
DE TIPOLOGIA E QUALIFICAÇÃO
A tipologia demandou a definição imediata sobre o
tipo de evento a ser escriturado, não ocasionando em maiores problemas para os
usuários; definir o que é uma admissão, uma CAT, um aviso prévio rescisório e
um aviso de dispensa, é algo bem simples dentro de um ambiente de DP. Porém, foram
estabelecidas regras para a qualificação do registro quanto à conformidade.
1. Um
evento só pode ser classificado como
estando “em conformidade” se TODOS os dados necessários a sua escrituração
estiverem disponíveis ao operador do sistema dentro do PRAZO legal previsto no
ato da escrituração ;
2. Havendo
atraso na escrituração provocado pela equipe do DP, mesmo ocorrendo a entrega
dentro do prazo por parte do empregador, o evento será classificado como fora
do prazo, e será segregado para apuração de índice de extemporaneidade
originado pela equipe do DP (índices não disponíveis nesta síntese). Foram
poucos casos neste contexto, cujos formulários foram separados para avaliação
“caso a caso”.
Exemplo 1: A informação de que um determinado
trabalhador será admitido, mesmo com até 1
dia de antecedência, mas sem todos os registros e processos previstos
(não informação do ASO, por exemplo) para a sua escrituração, também foi
classificada como “fora da conformidade”. O princípio é de que a informação
deve ser disponibilizada no prazo e de forma completa.
Exemplo 2: Um Aviso Prévio Rescisório informado com
todos os dados por parte do empregador, mas escriturado fora do prazo
(retroativamente) por parte da equipe do DP, foi classificado fora da
conformidade e marcado para avaliação da equipe de gestão para o E-SOCIAL do
escritório.
RESULTADOS
As admissões variaram em índices de 16% a 24%
quanto à conformidade, um resultado baixíssimo. O melhor resultado foi em agosto,
após intensa campanha junto aos empregadores. A Comunicação de Acidente de
Trabalho (CAT) ficou entre 8% e 18%.
Cabe salientar que os poucos casos (4) envolvendo
as CATs registradas dentro da conformidade, ocorreram em uma única empresa
(cliente do escritório) que dispõe de uma equipe de RH e uma base de apoio
formada por um especialista em DP, que dentro de um determinado prazo assumirá
todo o processamento da carteira trabalhista. Todos os demais casos foram
comunicados nos intervalos de 4 a 23 dias do ocorrido, ficando totalmente fora
da conformidade. Ou seja: Se retirarmos as CATs de um mesmo cliente, o índice de não conformidade vai para 100%
(29 casos).
Os índices para o Aviso Prévio Rescisório (APR)
ficaram entre 10% e 15%. Foram contabilizados os APRs emitidos por conta dos
empregadores ou dos trabalhadores. Os índices de Aviso de Dispensa (AD)
flutuaram entre 6% e 22%.
Sobre os ADs, em alguns casos, a conformidade se
verificou maior apenas nas situações em que as rescisões precisaram ser
homologadas em sindicatos ou unidades do MTE. Mesmo assim, os casos em que os
empregadores ordenaram a manipulação de datas de início de aviso prévio ou de
demissão, para aparentemente cumprir prazos de homologação e quitação das
verbas rescisórias, foram classificados como estando em “não conformidade”,
considerando ser uma prática com efeito retroativo e não adequada aos padrões
infralegais vigentes.
Cabe salientar que os pedidos de demissão sumários
(sem aviso prévio), não fizeram parte do estudo, assim como as demissões
ocorridas por justa causa.
MELHORES
PRÁTICAS
Com os formulários apurados e os dados
consolidados, foi obtido o índice de 16,65% de conformidade. Ou seja: a cada
100 eventos (dos tipos de eventos selecionados), cerca de 83 estariam sujeitos
a algum tipo de irregularidade.
Apenas nos quatro eventos analisados, poderiam ser
geradas, por mês, 258 ocorrências de
escrituração fora do prazo. Isto não quer dizer que serão todas convertidas em
infrações, mas que estão passivas de tal ocorrência.
Se o objetivo do trabalho foi possibilitar um
diagnóstico mais preciso sobre os problemas de cumprimento de prazos, mesmo que
trabalhando apenas quatro eventos, outros
objetivos podem ser derivados da aplicação e considerações sobre esta
avaliação.
No escritório pesquisado, os colaboradores são
constantemente treinados e a cartilha de práticas trabalhistas foi revisada
incluindo tópicos sobre a importância de se observar prazos.
O estudo também provou empiricamente que os demais
setores ainda estão desconectados de certos propósitos comuns. Por isso,
passaram a receber boletins sobre casos em que ficou evidente a ineficiência do
processo de integração das informações. Por isso, reuniões estão sendo
promovidas semanalmente para analisar como as informações podem ter um melhor
fluxo dentro do plano de atividades do escritório e dos clientes.
Não se trata de ser um trabalho por causa apenas da
E-SOCIAL, mas principalmente, sobre a necessidade de ser uma atividade proativa
diante dos processos fiscalizadores. Então, quatro questões foram pensadas para
serem debatidas e trabalhadas para que no próximo levantamento, previsto para o
primeiro trimestre de 2015, sejam apurados melhores índices:
1.
Em seguida, uma
campanha para uso de ferramentas pela internet foi disseminada entre os
clientes, seja por email ou por atendimento via web site. Ficou a pendência de
uma parte considerável que ainda mantêm o uso de malotes, o que torna o
processo de comunicação bastante moroso. No gráfico a seguir, demonstra-se como
as informações costumam chegar ao departamento do escritório. Notou-se um
aumento nos modos via internet, muito em parte devido a uma campanha maciça de
estímulo de uso das ferramentas, porém, bastou o ímpeto da campanha diminuir,
que os índices voltaram aos índices iniciais;
2.
Foram solicitados
relatórios com mais detalhes, no sistema interno do escritório, que possam
dispor cruzamentos de registros dos
eventos com o o momento do registro (data/hora) da ocorrência, ficando a
análise de conformidade ou não, a ser observada pelos colaboradores do DP,
“caso a caso”;
3.
Um modelo de TERMO DE
REPONSABILIDADE está sendo trabalhado para os clientes que continuarem com
baixos índices de conformidade. A finalidade é dar sempre um tom pedagógico à
questão sem deixar de promover esclarecimentos sobre as responsabilidades das
partes envolvidas;
4.
Um banco de dados
está sendo organizado para dar a cada empregador o diagnóstico preciso de
conformidade, alertando-os sobre os riscos da não observância de prazos e
estabelecendo metas para melhoria de índices, um trabalho que deverá ser feito
pelos organizadores do escritório “caso a caso” na base do “corpo a corpo”, usando
constantemente estratégias baseadas em franco diálogo.
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
É prudente considerar que o trabalho é pontual.
Contudo, é razoável questionar se será mesmo provável que em torno de 12 a 24 meses
(como se pode estimar a entrada da E-SOCIAL pelos seus gestores), será possível
que os empregadores brasileiros, em sua maioria, possam apresentar índices de
conformidade aceitáveis e que não coloquem em risco a própria viabilidade da
E-SOCIAL.
Seria interessante que os próprios gestores da
E-SOCIAL considerassem a aplicação de uma pesquisa mais ampla, em nível
nacional, para que seja dado um diagnóstico mais minucioso sobre a realidade
operacional de escritórios e empregadores, e não baseado apenas em suposições,
muitas vezes rasas e certamente, infundadas, levando em conta que as bases de
informações das atuais obrigações acessórias não possibilitam um levantamento
dessa natureza.
Imagino que, ao ignorar a necessidade de
diagnósticos mais precisos, os atuais gestores da E-SOCIAL podem estar
colocando em risco a execução do próprio modelo. Talvez, seja esse um dos
maiores entraves ao fechamento do projeto.
Assim, o maior desafio não será a finalização dos
leiautes, mas a comprovação da viabilidade do modelo operacional.
E por falar em viabilidade operacional, fica no ar
uma simples questão: Será que os membros do comitê gestor possuem certeza
quanto a isso?
Leonardo Amorim
LLConsulte Soli Deo gloria